Li o tópico inteiro apenas ontem à noite (e mais alguns novos posts hoje de manhã), e pude perceber algumas coisas:
:arrow: Os defensores do projeto acreditam em pai-dos-pobres.
Algumas pessoas estão defendendo o projeto ou porque estão subordinados a algum chefe supostamente incompetente que não possui diploma, ou porque se sentem injustiçados por não ter uma carreira decente depois de anos de estudo em uma instituição de ensino superior. Aos que pensam assim, meu recado: deixa de ser chorão! Vocês tem n alternativas para resolver os seus problemas, como: fazer cursos ou aprender sozinhos coisas novas; ter uma postura mais proativa e reclamar na empresa onde vocês trabalham aquilo que não lhes agrada; trocar de emprego, mas focando naquilo que seria bom pra vocês; abrir uma própria empresa onde vocês fixariam suas próprias regras… Ou seja, existem várias opções que o cara poderia fazer sozinho, sem depender do Estado pra intervir, mas que por alguma razão, não faz. Mas eis que surge alguém do Estado e lhes diz: “Não temam, descamisados! Farei uma lei que regulamentará a sua área para que sua vida seja melhor!”, e essa lei, quase que por mágica, removerá aquele chefe incompetente do lugar, fará sua carreira ficar mais significativa e seu salário crescer. Só duas dúvidas minhas ficam no ar: 1) porque ter essa visão esquerdista de que o Estado tem que intervir em cada aspecto da vida do indivíduo, quando seria mais fácil ele próprio ir atras do que ele quer? 2) porque acreditar na necessidade dessa regulamentação se, em casos extremos, as leis do trabalho ou código penal, seriam suficientes para lhes proteger?
:arrow: Os defensores acreditam que o Senador Eduardo Azeredo (PSDB-MG) é competente para lidar com assuntos de TI.
Aqueles que defendem o projeto de lei talvez nem saibam quem é Eduardo Azeredo, ou tem memória muito curta para lembrar. Ele foi governador na época em que FHC era presidente, e atualmente é senador. Há dois anos atrás, ele propôs uma lei sobre a internet no mínimo cômica, a de cobrar a identificação pelo RG de todo usuário brasileiro que entrasse na rede, prevendo punições a quem não cumprir (link), não precisou muito tempo para que a sociedade mostrasse o quanto isso era burocrático e ineficaz para controlar o cybercrime. Agora, o mesmo senador propõe outra piada disfarçado em projeto de lei. Não tenho dúvidas de que o senador não conhece nada da área de TI, mas parece que tem gente que ainda não se tocou.
:arrow: Os defensores do projeto exibem exemplos, supostamente bem-sucedidos, de outras profissões no Brasil, onde existem conselhos de classe.
Pode-se dizer que o médico tem seu registro, o contador tem, o advogado tem, o arquiteto tem, e que por isso seria importante o profissional de TI também ter; mas ainda sim não me convence, pois a nossa profissão possui uma dinâmica diferente. (Ainda seria possível questionar a real necessidade dos conselhos de classe atualmente existentes no Brasil, mas não tenho embasamento para tanto. Assumo que elas são importantes na minha argumentação, apesar de não acreditar muito nisso.) A primeira diferença é que nossa profissão, majoritariamente, é uma atividade realizada em grupo, cujo relacionamento entre os envolvidos se dá através de empresas e instituições; enquanto que em profissões como advogacia, medicina ou engenharia civil, a interação, na maioria dos casos, ocorre entre um único profissional e seu cliente; e nesse caso, um erro cometido por um profissional de TI pode ser corrigido pelo grupo, antes que ocorram conseqüências graves, enquanto que um erro cometido por um profissinal liberal possui impacto direto em seu cliente. A segunda diferença é que algumas profissões, como médico, interferem diretamente na vida e no bem-estar de seus clientes, erros podem causar perdas de vidas humanas; a área de TI não sofre disso, mesmo que o profissional construa um software que controle bombas nucleares ou que monitore batimentos cardíacos, porque haverá por trás, os stakeholders que farão a homologação do software em ambiente controlado para que, numa situação real, os riscos de perdas humanas não ocorram. Quem acha que o médico poderia fazer essa mesma homologação antes do paciente entrar na faca?
:arrow: O projeto desconsidera fatores realmente relevantes para a TI no Brasil
A Índia é lider nos contratos de terceirização, e o Brasil não chega nem perto, contentando-se com as sobras do mercado externo e com o pouco que resta do interno. Do salário líquido que o trabalhador recebe, quase o valor de um outro salário é pago ao Estado, fazendo com que o trabalhor receba um salário de país de terceiro mundo, enquanto a empresa paga um de país de primeiro mundo. As instituições de ensino de TI no Brasil são poucas, e do que se tem, somente algumas possuem uma qualidade decente. Agora me diga: dos problemas citados, quais o projeto de lei se propõe a resolver? Se você disse nenhum, acertou. O projeto de lei não só não resolve nenhum problema da área como pode criar complicações que, se levado em prática, faríamos perder cada vez mais competitividade. Exemplo: potenciais trabalhadores que deixariam de ter o direito trabalhar em TI, poderiam facilmente ser substituídos por trabalhadores na China ou na Índia. Já pensaram nisso?